segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Teoria do Estado 25

4 O SISTEMA DIRETORIAL
Jose Luiz Quadros de Magalhaes

O sistema diretorial caracteriza-se pela submissão do Executivo à vontade do Legislativo, numa organização impessoal por intermédio de condução colegiada das políticas de governo.
Sem dúvida alguma, pela explicação inicial, o sistema diretorial é o mais adequado para a construção de uma democracia parti¬ci¬pa¬ti¬va e cidadã, uma vez que impossibilita a construção de uma política go¬ver¬namental em torno de pessoas, líderes carismáticos que venham atender às expectativas pessoais ou o chamado “ideal de ego”do eleitor, que se realiza através do seu líder.
No sistema diretorial, o Poder Executivo encontra-se dentro do Poder Legislativo; em outra palavras, o Poder Executivo é um órgão do Poder Legislativo.7 A Suíça é um exemplo atual do sistema diretorial que foi amplamente utilizado pelos países do Leste Europeu sob a influência soviética.
O Diretório é um órgão encarregado do exercício do Poder Executivo, eleito pelo Poder Legislativo ou diretamente pelo voto popular. Existem variações no próprio sistema diretorial suíço, no qual, em alguns “Cantões, existe a possibilidade de destituição, pelos eleitores, dos seus representantes. Entretanto, o ponto essencial do sistema é a impossibilidade de o governo contrariar a vontade do Poder Legislativo.
O Diretório adota o revezamento no poder de presidentes que se sucedem, evitando a personalização do poder na figura de uma pessoa. Quando a política do Diretório contraria as determinações do Poder Legislativo, o Diretório tem de se submeter à vontade daquele, não existindo a possibilidade de dissolução do parlamento ou queda de governo.
O sistema diretorial traz inovações em relação ao sistema parlamentar, uma vez que submete o Poder Executivo à vontade do Poder Legislativo, não existindo ainda a possibilidade de dissolução do parlamento ou queda do gabinete.
Acreditamos que, entre os sistemas de governo estudados, o diretorial seja o mais democrático. Podemos destacar suas características da seguinte forma:

a) a busca da plena despersonificação do poder por intermédio da criação de um governo coletivo subordinado a um coletivo ainda maior. Nesse sistema, o Poder Executivo é um órgão do Poder Legislativo composto por representantes eleitos pelo parlamento e subordinados à vontade deste em caso de posições dissonantes entre Executivo e Legislativo;
b) não há dissolução do parlamento nem queda do governo, uma vez que estes mecanismos não são necessários com a subordinação do Executivo (órgão do Legislativo) ao parlamento. Para buscar a despersonalização do poder, o Executivo é coletivo, sendo que todas as decisões desse órgão são tomadas sempre de forma coletiva por meio de votações, não existindo um chefe entre os membros do diretório, mas apenas um coordenador dos trabalhos e representante do governo coletivo. Esse coordenador e representante pode ser chamado de presidente e, para efetivamente garantir-se a plena despersonificação do poder, haverá sempre um revezamento periódico entre os presidentes (coordenadores) do Diretório.

• O sistema suíço – A Suíça constitui, hoje, um dos sistemas democráticos mais avançados, combinando uma acentuada descentralização de poder em um federalismo que tem origem na união de cidade-estado para evitar o absolutismo no século XIII, com quinhentos anos de ensino público gratuito introduzido pelos franceses no final do século XVIII, na única democracia de concordância (ou de consenso) existente no mundo.
A democracia suíça guarda ainda interessantes peculiaridades. O voto feminino só foi introduzido na década de 70 do século XX, per¬sistindo ainda, em alguns casos, o instituto do Landsge¬meinden, a democracia direta, na qual os homens da cidade discutem a gestão desta sem representantes. O plebiscito, como o referendo legislativo e constitucional, é comum em âmbito federal e nos Estado membros, com um grau de participação grande (em torno de 40 por cento, variando segundo a matéria). Textos legislativos importantes foram adotados por meio de referendo legislativo, como a primeira legislação trabalhista, o Código Penal de 1937, a lei de seguridade social para os idosos e o segundo estatuto da relojoaria da Suíça, lei de extrema importância naquele país.
Os Estados membros, chamados Cantões, em número de 23, e ainda três semicantões, também adotam o sistema diretorial com variações. O Diretório da União é formado por sete membros eleitos pelo parlamento, havendo um revezamento anual do seu presidente (coordenador). A democracia de concordância representa a renúncia ao princípio majoritário e é representada pelo consenso que supera ou absorve os conflitos geradores dos partidos políticos: a equação do conflito capital/trabalho, representado pelo Partido Socialista Suíço (20 por cento); a equação do conflito centro/periferia, representado pelo Partido Radical Democrático (25 por cento), a equação do conflito entre Igreja/Estado, representado pelo Partido Democrata Cristão (25 por cento); e a equação do conflito rural/urbano, representado pelo Partido Democrático do Centro (ex-radicais e agrários – 10 por cento). Esses quatro partidos estão sempre representados no Diretório onde se encontrou a concordância política, lingüística e religiosa da seguinte forma: dos sete membros, dois serão radicais, dois democrata-cristãos, dois socialistas e um do centro-democrático, não importando qual o resultado das eleições parlamentares. Quando um partido novo encontra uma consagração incontestável no parlamento (conselho nacional), ele também chega ao governo do país:8

O governo de concordância

Concordância 2 2 2 1 centro
política radicais democratas socialistas agrário
cristãos

Concordância 2 de língua 1 italiano 1 francês 1 alemão
lingüística alemã 1 francês 1 alemão

Concordância 2 2 1 católico 1
religiosa protestantes católicos 1 protestante protestante


Devemos mais uma vez ressaltar que o ponto fundamental e de relevância neste sistema é a sua total impessoalidade, que não se constrói sobre os atributos pessoais de um líder, fato que nem mesmo o sistema parlamentar conseguiu afastar. A permanência no poder, por mais de dez anos, de líderes como Margareth Tatcher (Grã-Bretanha), Helmut Koll (Alemanha), Felipe Gonzáles (Espanha), Andréas Papandreau (Grécia), Cavaco e Silva (Portugal) demonstraram, em alguns casos, uma vez que se torna impossível generalizar, que o sistema parlamentar não oferece garantias absolutas contra o personalismo ou o projeto de governo centrado na figura desses líderes.
Podemos concluir, a partir dessas observações, que o sistema de governo pode colaborar para evitar distorções personalistas do exercício do poder que podem conduzir a formas menos democráticas ou mesmo estagnar o processo de construção de um Estado e de uma sociedade efetivamente democráticos.
É necessário, entretanto, frisar, mais uma vez, que a estrutura estatal definida no texto constitucional, no que se refere à forma de Estado, à forma de governo e ao sistema de governo, não podem garantir a evolução do processo democrático. Existem opções sobre esta estrutura fundamental do Estado que podem auxiliar no sentido de evitar distorções indesejáveis que venham limitar os direitos fundamentais e o aprofundamento da participação popular nos destinos do Estado, mas que não são capazes de propiciar todas as garantias democráticas de permanência e evolução do processo democrático.
Importante é, pois, a análise do regime político, do sistema político e dos fatores essenciais que hoje, cada vez mais, ameaçam a livre formação e expressão do pensamento e da vontade dos cidadãos.








1 VENÂNCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no domínio econômico. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1968. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 5. ed., São Paulo: Saraiva, 1981. ACCIOLI, Wilson. Instituições de direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1978. FERREIRA, Luiz Pinto. Princípios gerais de direito constitucional moderno. 6. ed., São Paulo: Saraiva, 1983.
2 BRANDI, Paulo Vargas. Da vida para a história. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.

3 TOLEDO, Caio Navarro. O governo Goulart e o golpe de 64. 5. ed., São Paulo: Brasiliense, 1984. BANDEIRA, Moniz. Trabalhismo e socialismo no Brasil – A internacional socialista e a América Latina. São Paulo: Global, 1985. BENEVIDES, Maria Victoria. O governo Jânio Quadros. São Paulo: Brasiliense, 1981.

4 GALEANO, Eduardo. As veias abertas na América Latina. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. MOURA, Gerson. Tio Sam chega ao Brasil – A penetração cultural americana. São Paulo: Brasiliense, 1984.

5 PIZZORUSSO, Alessandro. Sistema instituzionale del diritto publico italiano. 2. ed., Nápoles: Jovene, 1992. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 1979. El control parlamentario del govierno en las democracias pluralistas (el processo constitucional espãnol). In: TERCERAS JORNADAS INTERNACIONALES DA CIÊNCIA POLITICA Y DERECHO CONSTITUCIONAL. Barcelona: Labor, 1978. RIBEIRO, Darcy. Formas e sistemas de governo – República x monarquia, presidencialismo x parlamentarismo. Petrópolis: Vozes, 1993.

6 BOBBIO, Norberto. O conceito de sociedade civil. 2. ed., Rio de Janeiro: Graal, 1982. BOBBIO, Norberto. Estado, governo e sociedade – Para uma teoria gral da

política. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. BOBBIO, Norberto. Ensaios escolhidos. São Paulo: C.H.Cardim. ZAMPETTI, Píer Luiz. La participación popular en el poder. Madrid: EPESA, 1977.

7 AUBERT, Jean François. Traité de droit contitutionnel suisse. Suisse: Edes et Calendes, 1967.
______________________________________________________________________________________________
8 DUHAMEL, Olivier. Les democraties. Paris: Seuil, 1993, p. 125-126.

Nenhum comentário:

Postar um comentário