segunda-feira, 2 de maio de 2011

314- Direitos Humanos 6 - Globalização

TEXTO PUBLICADO ORIGINALMENTE NA DÉCADA DE 1990. INTERESSANTE ANALISAR DIANTE DO CAMINHO TOMADO PELA GLOBALIZAÇÃO E A CRISE RADICAL DO NEOLIBERALISMO EM 2008.




2.3 A globalização



JOSE LUIZ QUADROS DE MAGALHÃES



O que é a globalização? Para responder a essa pergunta vamos consultar os mais recentes estudos sobre a questão.

Para Jean Luc Ferrandérry, a globalização é um conceito que apareceu no meio da década de 80, nas escolas de negócios norte-americanas e na imprensa anglo-saxã. Essa expressão designa um movimento complexo de abertura de fronteiras econômicas e de desregulamentação, que permite às atividades econômicas capitalistas estenderem seu campo de ação no planeta. O aparecimento de instrumentos de telecomunicação extremamente eficientes permitiu a viabilidade desse conceito, reduzindo as distâncias a nada. O fim do Bloco Soviético e o aparente triunfo planetário do modelo neoliberal no início dos anos 90 parecem dar a essa noção uma validade histórica. Na França foi escolhido o nome mundialização para substituir globalização, que insiste, particularmente, sobre a dimensão geográfica e tentacular, sem esquecer o sentido original.20

Podemos então dizer que o termo globalização tem sua origem na literatura destinada às firmas multinacionais, designando inicialmente um fenômeno limitado a uma mundialização da demanda se enriquecendo com o tempo até o ponto de ser identificada atualmente a uma nova fase da economia mundial.

Não há, entretanto, uniformidade na conceituação do termo, podendo-se encontrar quatro significados distintos mas semelhantes:



1. Théodore Levitt propõe este termo para designar a convergência de mercados no mundo inteiro. Globalização e tecnologia serão os dois principais fatores que fazem as relações internacionais. Em conseqüência, a sociedade global opera com constância e resolução, com custos relativamente baixos, como se o mundo inteiro (ou as principais regiões) constituíssem uma entidade única; ela vende a mesma coisa, da mesma maneira em todos os lugares.21 Nesse sentido, a globalização dos mercados se opõe à visão anterior de um ciclo de produção, que consistia na venda ao países menos avançados dos produtos que ficaram obsoletos nos países mais ricos. O termo se aplica mais à gestão da multinacionais e diz respeito exclusivamente às trocas internacionais.22

2. Em 1990, esta noção é estendida por Kenichi Ohmae ao conjunto da cadeia de criação do valor (pesquisa-desenvolvimento [P-D], engenharia, produção, mercado, serviços e finanças). Se num primeiro momento uma empresa exporta a partir de sua base nacional, ela estabelece em seguida serviços de vendas no estrangeiro, depois produzidos na localidade e, ulteriormente, ainda estabelece uma medida completa da cadeia de valor na sua filial. Este processo converge em direção a uma quinta etapa: a integração global, uma vez que as empresas que pertencem a um mesmo grupo conduzem o seu P-D, financiam seus investimentos e recrutam pessoal em escala mundial. Dessa forma globalização designa ainda uma forma de gestão, totalmente integrada em escala mundial da grande empresa multinacional.23

3. Desde que essas multinacionais representam uma fração importante da produção mundial, os diversos espaços nacionais se encontram obrigados a se ajustarem às suas exigências, pelo fato da extrema mobilidade de que elas se beneficiam hoje (comércio, investimento, finanças e P-D). Assim, a globalização significa o processo através do qual as empresas – as mais internacionalizadas – tentam redefinir a seu proveito as regras do jogo antes impostas pelos Estados-Nação. Nessa conceituação deixamos o domínio da gestão interna das empresas para abordarmos a questão da arquitetura do sistema internacional. Passamos da micro para a macroeconomia, das regras da boa gestão da economia privada para o estabelecimento de políticas econômicas e a construção ou redefinição das instituições nacionais. Essa noção evoca muito mais o processo em curso do que um estado final do regime internacional que substituirá aquele de Bretton-Woods. Constantemente, alguns sublinham o caráter irreversível das tendências em curso diante impotência das políticas tradicionais dos governos frente as estratégias das grandes empresas.

4. Finalmente, a globalização pode significar uma nova configuração que marca a ruptura em relação às etapas precedentes da economia internacional. Antes, a economia era internacional, pois sua evolução era determinada pela interação de processos operacionais essencialmente no nível dos Estados-Nação. No período contemporâneo vemos emergir uma economia globalizada na qual as economias nacionais serão decompostas e, posteriormente, rearticuladas no seio de um sistema de transações e de processos que operam diretamente no nível internacional. Essa definição é a mais geral e sistemática. De uma parte, os Estados-Nação, e, por conseqüência, os governos nacionais, perdem toda a capacidade de influenciar as evoluções econômicas nacionais, a ponto de as instituições centralizadas herdadas do pós-guerra cederam lugar a entidades regionais ou urbanas, ponto de apoio necessário da rede tecida pelas multinacionais. De outro lado, os territórios submetidos a esse novo modelo ficam fortemente interdependentes, a ponto de manifestar evoluções sincronizadas, por vezes idênticas, mas em todo caso em via de homogeinização. Adeus, portanto, ao compromisso político nacional e à noção mesmo de conjuntura local.



2.4 A ALTERNATIVA

José Luiz Quadros de Magalhães





Adeus ao compromisso nacional e à noção de conjuntura local?

Olivier Dolfus afirma:



“A mundialização não suprimiu as atividades locais, de proximidade: como aquelas do cabeleireiro ou da escola maternal. Alguns processos, locais, não têm influência e seus efeitos sobre o lugar se apagam rápido (a fumaça de uma chaminé). Mais adicionados na escala global, produzem fenômenos de uma natureza diversa que intervém em níveis espaciais e temporais sem uma medida comum com os fluxos modestos originais. Desta forma nada será mais falso que pensar que do local ao global, os fenômenos se repetem um dentro do outro como as bonecas russas. Praticamente, a cada nível, eles mudam de valor, senão de natureza ou de sentido: alguns se somam, outros se multiplicam e outros se anulam.”24



Por tudo que estudamos até aqui, percebemos que permanece uma grande interrogação: para onde ir ? O neoliberalismo não é capaz de responder às necessidades de trabalho e bem-estar social da população mundial; o socialismo real está ameaçado de desaparecimento; o liberalismo clássico morreu para não mais voltar; e o Estado Social está em crise de difícil solução, pois que mergulhado num mundo globalizado. Para onde ir?

A resposta está na construção da sexta fase de evolução do Estado, uma alternativa de uma democracia participativa que deve ser construída em nível local, na cidade – espaço da cidadania –, encontrando um novo papel para o Estado e para a Constituição.25

Todos os três tipos de Estados que já estudamos, nas suas variadas formas e nas distintas fases de evolução, têm um ponto fundamental em comum: todos estabelecem na Constituição um modelo de sociedade e de economia. Seja o modelo liberal, cuja regra básica é a não-intervenção no domínio econômico, numa sociedade que tem como valor principal o individualismo e a propriedade privada; seja no Estado Socialista, que tem Constituições que estabelecem uma economia e uma sociedade socialista, com fundamentos e valores coletivos, até o Estado Social, modelo de Constituição eclética, na qual convivem lado a lado os princípios dos tipos de Estados ortodoxos socialista e liberal, invariavelmente as Constituições, a partir do século XVIII, estabelecem um modelo de Estado, de sociedade e de economia que deve ser obrigatoriamente seguido por todos os cidadãos. Os que não seguem o modelo posto são os excluídos, os miseráveis, os loucos e os presos, marginais do sistema.

O papel do Direito, da Constituição, é o de estabelecer as margens, os limites dessa sociedade, e, embora estes limites sejam cada vez mais amplos, eles continuam a existir como requisito e mesmo razão de ser do Estado.

Assim, o Estado tem como finalidade importante a função de reagir e conservar. Conservar o modelo de sociedade e reagir com sua força a qualquer tentativa de mudança fora das permitidas pelo modelo posto. Mesmo com o atual enfraquecimento do Estado Nacional, este ainda é importante no sistema globalizado para reagir a qualquer tentativa de mudança fora dos limites estabelecidos, agora, pelo grande capital globalizado, conservando o modelo existente e seus interesses e sistema de privilégios.

No lugar desse Estado reacionário, nas suas formas liberal, socialista, social-liberal, social-fascista e neoliberal, devemos propor um Estado democrático, onde a Constituição nacional garanta os processos democráticos de constante mudança da sociedade, com respeito aos direitos humanos universais não culturais, deixando que cada Município estabeleça na sua Constituição, de forma livre e democrática, o seu próprio modelo de sociedade, de economia, de repartição de riquezas e de convívio social, desde que respeitados os processos democráticos da Constituição nacional, e que sejam respeitados os princípios universais de direitos humanos.

O caminho em direção ao novo poder das cidades, o poder local, hoje é sentido de maneira inequívoca em todo o mundo. Os mecanismos, princípios, modificações estruturais na administração municipal são estudados no nosso livro Poder Municipal: paradigmas para o Estado constitucional brasileiro, para o qual remetemos o leitor para compreensão da alternativa democrática proposta.



Para finalizar este item, classificamos os direitos individuais de acordo com Constituições contemporâneas, como a seguir:



1. Igualdade jurídica (fundamento de todos os outros direitos individuais)

2. Liberdades físicas:

2.1. liberdade de locomoção;

2.2. segurança individual;

2.3. inviolabilidade de domicílio;

2.4. liberdade de reunião;

2.5. liberdade de associação.

3. Liberdade de expressão:

3.1. liberdade de palavra e de prestar informações;

3.2. liberdade de imprensa;

3.3. liberdade de arte;

3.4. liberdade de ciências;

3.5. liberdade de culto;

3.6. sigilo de correspondência, de comunicações telefônicas e telegráficas.

4. Liberdade de consciência:

4.1. religiosa;

4.2. filosófica;

4.3. política;

4.4. liberdade de não emitir o pensamento.

5. Propriedade privada (Direito).

6. direito de petição e de representação.

7. Garantias Processuais (Garantias de eficácia propriamente ditas):

7.1. habeas corpus;

7.2. habeas data;

7.3. mandado de segurança;

7.4. mandado de injunção;

7.5. ação popular;

7.6. ação direta de inconstitucionalidade por ação e omissão;

7.7. princípios fundamentais de Direito Processual:

7.7.1. garantia da tutela jurisdicional;

7.7.2. o devido processo legal;

7.7.3. o juiz natural;

7.7.4. ainstrução contraditória;

7.7.5. ampla defesa;

7.7.6. acesso à Justiça;

7.7.7. publicidade.

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