sábado, 16 de novembro de 2013

1374- Ensaios José Luiz Quadros: Partidos, parlamentos e eleições: a maquina processadora de legitimidades "democráticas" majoritárias de decisões minoritárias.



Partidos, parlamentos e eleições: a maquina processadora de legitimidades "democráticas" majoritárias de decisões minoritárias.
José Luiz Quadros de Magalhães

            Como funciona a democracia representativa majoritária? "Roma Locuta, Causa Finita". Voltamos a formula estrutural do sistema do direito moderno: "nós x eles", como um processo de competição permanente, onde o vencedor proclamado interrompe aquela competição especifica. Uma pergunta: qual a disposição para o debate na democracia concorrencial majoritária? Existe a possibilidade de consensos ou a lógica concorrencial impede o diálogo?

            Vejamos. No processo eleitoral, as partes envolvidas se filiam a partidos políticos com programas e ideologia definida (o que cada vez existe menos). Cada partido, cada parte terá seus argumentos construídos em um espaço interno democrático no partido, onde poderia ser possível construir consensos sobre as questões de políticas públicas as mais diversas. É necessário constatar até que ponto estes partidos têm uma estrutura interna de debate que permita a construção de consensos, ou se ao contrário, as decisões também são tomadas pela lógica majoritária que é concorrencial e impede (dificulta) consensos. Vamos descobrir que, nos partidos, que ainda constroem sua ideologia político-partidária por meios dialógicos, a decisão ocorre por meio do voto majoritário o que inviabiliza (dificulta) o consenso. Entretanto, a maior parte dos partidos políticos neste inicio de século XXI, não guardam mais coerência político-ideológica, o que resulta em um pragmatismo sem ética de busca do poder pelo poder.

            Continuando a lógica da democracia representativa majoritária, estes partidos que construíram suas propostas, políticas públicas e ideologias, se apresentam para as eleições, para então o "povo" escolher (Roma Locuta) e a controvérsia, expressa na busca pela vitória nas eleições, acabe (Causa Finita), com a proclamação da vontade da maioria. Neste momento a minoria (insatisfeita) se submete à maioria, sempre dividida, pois se constitui também majoritária, em processos internos que reproduzem o mesmo mecanismo. Percebemos que este processo inviabiliza qualquer possibilidade de consenso, pois desde o inicio, o que se busca, é a vitória: do partido, do projeto de lei, do melhor argumento (?).

            Melhor argumento? Será que o parlamento efetivamente funciona com a lógica da vitória do melhor argumento? Qual é o melhor argumento? Depois de eleito o governo e de eleitos os parlamentares, o governo continua funcionando da mesma maneira: "Roma Locuta, Causa Finita". Para que o governo governe, este necessita de maioria parlamentar (ou maiorias) para que aprove seu projetos, sua lei orçamentária, seu plano de governo. Continuamos portanto no nível parlamentar com a mesma busca da vitória. O sistema concorrencial continua inviabilizando qualquer possibilidade de construção de consenso. Vamos acreditar, por enquanto, que os argumentos expostos e contrapostos no parlamento sairão vitoriosos na medida de que estes são melhores ou piores, ou, que a discussão no parlamento ocorre em torno de argumentos racionais.

            Vejam que já abandonamos qualquer debate intercultural e que a argumentação acima se desenvolve sob a lógica hegemônica de quem diz o que é direito. Os partidos políticos, em geral, não trazem uma outra perspectiva ou alternativa à lógica moderna, representando, durante boa parte do século XX, a controvérsia entre direita e esquerda, conceitos modernos que se fundam na lógica moderna europeia binária (o centro será o terceiro incluído ou uma farsa política?). O pluralismo partidário poderia sugerir uma possibilidade de superação do pensamento binário na política moderna, o que não ocorreu por força da lógica majoritária e a divisão entre situação (governo) e oposição.

            No parlamento, os representantes, quando discutem o projeto de lei, de reforma legal ou constitucional, argumentam a partir de seu partido político, visando a vitória de seu projeto. São sempre parciais, esta é a ideia. Será que este processo permite que, neste debate, um escute o outro? Haverá efetivamente a possibilidade de diálogo? Há uma comunicação possível? Quando a pessoa que argumenta vai para um debate com a intenção de vencer ou outro, esta pessoa estará aberta para ser convencida, ou todo o argumento do outro será recebido para ser imediatamente desmontado?

            A lógica concorrencial tende ao totalitarismo. No final só restará o "melhor" e o "derrotado" tende ao ocultamento, um esquecimento provisório. Claro que, se observarmos o funcionamento dos parlamentos contemporâneos nas Américas ou Europa perceberemos que, em muitos casos, não se trata de uma concorrência de argumentos, de vitória de melhores argumentos, mas de um mercado como espaço de negociação a partir de posições de força, sustentada por interesses corporativos fora do parlamento. Em outras palavras, o problema da lógica concorrencial que inviabiliza o consenso, e o risco de que a vitória do melhor argumento oculte o argumento derrotado, foi superado pela criação de espaços de negociação que não se fundam em argumentos racionais mas na força e poder de negociação em um mercado político determinado por interesses preponderantemente econômicos.

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